domingo, 15 de agosto de 2010

Ética X Moral X Estética

Alguns reparos de “História Essencial da Filosofia” Vol.5, de Paulo Ghiraldelli Jr., pela Universo dos Livros, 2010, situam bem às concepções tipificadas na matéria, eventualmente atravessada por definições ou mesmo contradições que, diferentemente da unanimidade, obrigaram a pensar. O tipo de anotação sobre observações de terceiros apresenta evidentes limitações que somente insensatos negariam, mas já fica recomendada a elucidativa leitura referida, e aberta a temática abordando:

Etiqueta prática em público? Ética, enquanto ação moral, doméstica, privada, familiar ou pessoal contemplada(s), aplicada à vida social, se expressa até por regramentos legais e inclinações estéticas, estilos e atitudes de autoria individual ou coletiva identificada com tal pensamento ou filosofia. Se observa a(s) moralidade(s) vigentes, ou reflete-as criticamente, portanto, já é “ética”, que pode merecer ainda mais fundamentos ou justificativas, validando ou não preceitos eticomorais vigentes, em conceitos filosóficos tratando de outros. Assim, quando pesamos as consequências previsíveis de nossas atitudes, ou mesmo apreciamos “nossos deveres”, podemos estabelecer princípios que tendem a ser, por exemplo, classificadas como “naturalistas”, “relativistas” ou “emotivistas”, com força ou sabedoria. Tais rótulos podem orientar o uso das idéias, mas também perigam enfraquecê-las se não ficarem contextualizados, por exemplo: o naturalismo em arte não é dizer que as coisas deveriam mesmo ser como (dizemos que) elas são “normalmente”, mas é o nome que se dá a tal linha de pesamento em discussões sobre a justificativa da via de regra moral. “O” relativista também pode não ser o que “dança conforme a música”, o contraditório, especialmente quando guarda certas proporções entre os comportamentos que correlaciona, fazendo questão de pensar por conta própria para ão aderir a uma resposta pronta do tipo “os civilizados se reconhecem” ou “é a lei (dos valores astronômicos) desde que o mudo é mundo” (de tipo “escrita nas estrelas”). Embora não precisemos nos auto-enquadrar, não falta quem assuma e defenda o trabalho relativista, nos estudos culturais desmistificando barbáries impingidas em nome da civilização ou mesmo da modernidade, em análises adotadas como estudos muito sérios da História, que não nos isentam de elaborar posições, de entender que as coisas não se equivalem todas, por mais “que digam, que falem”, que não estão ou estamos “fazendo nada” - ou mesmo pesem diversamente nossos preceitos igualitários, por exemplo. Os emotivistas consideram o sentido de afirmações como verdadeiro ou falso, na abordagem aos fatos mundanos, mas uma caracterização de expressões éticas como meramente emotivas, feito grunhidos, vaias, aplausos, etc., de portadores de motivos pelos quais podemos, ou não, vir a nos interessar, trocando algo que se pareça com uma idéia, com argumentações que “até podem” transformar posicionamentos, sempre acompanhados de incentivos ou reprovações que distinguem as colocações morais. Uma clivagem moral bem categórica, em religião ou filosofia, pretende tratar do dever, seja o de obediência à expressão do amor, seja o de agir em coerência com o que possa ser tomado como “legal” por todos neste mundão (famoso “imperativo categórico” de Immanuel Kant (1724-1804), bem livremente traduzido), limite cujo desrespeito se torna aberrante, muito mais que apenas desgostoso. Esta última formulação, que não é simplesmente equivalente a um “aja com os outros como gostarias que eles agissem contigo”, e nega a “mentira” qualquer forma de legitimidade, também serve de critério para a avaliação das linhas de pensamento sobre atitudes e costumes acertados ou “nem”, como se diz, se pesa, entre moçadas do nosso educandário. Evito rotular os autores com lugares comuns inclusive por razões já adiantadas, mas aproximá-los por “afinidades” ou mesmo proximidade geográfica pode ser de indispensável utilidade e não “só para inglês ver”, como o caso justamente dos utilitaristas ingleses, como John Stuart Mill (1806-1873), que assumindo a relação entre ausência de dor e felicidade (clássica, também explicitada no epicurismo que origina o estoicismo, por exemplo) tomam como “valor” o que seja útil a tal condição entre os seres humanos. São princípios que dão a entender como regramentos generalizados podem ser complicados: em que casos seria canalhice, por exemplo, operar ou não operar desilusões? Quem continua na conversa vive descobrindo coisas, incrementando o interesse pelos casos das culturas em questão onde “a discussão racional reaparece exatamente porque se as consequêcias não foram pré-julgadas, elas são repostas na mesa de conversação para os que estão observando o quadro.”

Alta voltagem, adrenalina e tensão no filme de investigação da máfia industrial e política da ultraviolência pornográfica conduzida com sangue frio e saturado de dados razoavelmente coordenados a ação estratégica ou ainda mais “ligada” do que turbinada ou visualizada? O romance de intriga pode ser um caso bastante seriamente pensado, e decidido, de estilo e pensamento, atitude e consumo responsável de apetrechos curriculares e midiáticos numa selva de símbolos nem que os operadores de símbolos astronômicos não explicam – mas tampouco desconhecem, como alguns “astronautas” que poderiam esquecer das rais pressões de rotineiras agendas de trabalho sobre a terra, ou mesmo do enfrentamento “à beleza”, cujo grito, em plena fuga ou derrota, do artista, bem poderia ser a própria arte, uma das concepções talvez um tanto “góticas” ou tradicionais do poeta autor de “As Flores do Mal”, Charles Baudelaire (1821-1867). Essa literatura a problematizar a noção estética, de beleza e reflexão sobre ela enquanto um fazer “a coisa certa”, ética aplicada, já se estuda na relação com o absurdo de uma época que também não deixa de ser “a nossa”.

Os fluxos de acontecimentos nos pressionam de modo não raro cruelmente misterioso, fazendo o vivente debruçar-se sobre si mesmo para realizar seu potencial de sabedoria e encontrando zonas sombrias ou nebulosas, forças independentes da própria consciência, crença racional e palavra “do sujeito”, cuja própria “racionalidade” operada por uma identidade personificada pelo fator “eu” parece colocada em cheque, na verdade, quando se reconhece a subjetividade povoada por instintos e mundos sombrios, intuições viciadas deslocando sintomaticamente as próprias palavras dos sujeitos, só para ficar a floresta de símbolos em que não deixamos de vivenciar a selvageria do homem e o imediatismo dos pacientes. Se é tão difícil às pessoas se assumirem, paciência, não é simples a responsabilidade da liberdade, o enfrentamento de poderosas pulsões de morte e de união, agregações para além de vantagens e necessidade, inclusive, mas origem vital de muita criatividade também, já que temos de nos esquecer tanto e “morrer” tantas vezes. O desenvolvimento da pessoa que se satisfaz a vida ou do coletivo que se forma e cresce são campos atravessados de diretrizes problemáticas quanto aos valores culturais que herdamos ou que exercitamos a prática, como atitude moral. Exigimos demais do equilíbrio humano? Tiramos o corpo fora para não sentir julgamentos recaindo sobre ossas condutas? Evidente, escolhas acarretam custos nem sempre bem compreendidos, e uma racionalização incompleta de compensações desajuíza ainda mais, mas trata-se de conquistar a aprovação de tradições e fantasmas, de estar em paz com as suas leis primordiais a ponto de ser exemplo, dar muitos exemplos, estar à altura dos heróis e santos, etc., o que pode ser dolorido e frustrante quando implica em desvantagem ou ônus levando às culpas e aos ressentimentos consecutivos (de alguns tabuleiros de análises como estas pretendendo dar conta de conexões entre ânimo, destinos e conjuntos progressivamente abrangentes mesmo antes de entender muitos momentos da própria escola...). Por outro lado o comedimento pensante que permite inverter o incômodo diante da ação equivocada de outrem é altamente surpreendente e não corresponde necessariamente às credenciais intelectuais em vigor nesta civilização e escola. Uma posição de recuo ou estabelecer apenas princípios para a conduta a ser proposta e/ou desenvolvida abrirá caminho para campos mais apaixonantes de trabalho ou tamanha neutralidade na filosofia prática só nos desviaria do tema real, das sabedorias e dos seus saberes? Os limites assumidos na correlação de julgamentos e desejos, satisfações, ainda são os da argumentação humana, pela qual Sigmund Freud (1856-1939) parece não querer se comprometer, como se os “vícios de linguagem” fossem algo mais além de regra e moedas correntes.

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